Walter Benjamin e o Arco-íris
TEXTOS, ARTIGOS E CRÔNICAS
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Marcelo Coelho
A gente sempre se espanta com o fato de que, a partir de apenas sete notas (doze, na verdade), seja possível criar um número infinito de músicas. Mas é também espantoso que todas as cores do mundo, igualmente infinitas, se originem apenas da mistura de três. Quem tem um tempo de brincar no computador já experimentou escolher cores diferentes de tela ou mesmo dos caracteres do word, e tem à sua disposição uma paleta lindamente nuançada , com seus vários arco-íris desdobrados em várias escalas de intensidade e luz.
Antes de seus estudos sobre Baudelaire e sobre o Drama Barroco Alemão, o crítico e filósofo Walter Benjamin dedicou-se a algumas especulações sobre a essência das cores --tema clássico no pensamento romântico alemão, desde Goethe. Cito um trecho muito bonito de "A visão das cores de uma criança", texto escrito entre 1914 e 1915:
A cor é algo espiritual, algo cuja claridade é espiritual, pois quando as cores se misturam, elas produzem novas cores, não um borrão. O arco-íris tem a pureza da infância.
O que interessava Benjamin era a idéia de que, de uma realidade sensível, empírica, material, como a cor, pudesse deduzir-se algo de espritual e infinito. O peso, a espessura, a grosseria da matéria tenderiam a fazer com que tentativas de superposição de muitas cores resultassem numa massa obscura e feia. É o que nos acontece quando, na infância, aprendemos que azul com amarelo dá verde; logo tentamos fazer isso com a tinta guache, e dá razoavelmente certo. Só que, depois de mais umas experiências e misturas, o resultado acaba sendo a famosa cor-de-burro quando foge. No computador, assim como na natureza, a mistura entretanto dá certo, novas cores sempre se criam, porque qualquer que seja a dosagem entre as três cores básicas, está sempre garantindo o resultado uma quantidade fixa de transparência e luz.
Segundo Martin Jay ("Is Experience Still in Crisis? Reflections on a Frankfurt School Lament", in The Cambridge Companion to Adorno), que cita os estudos de Howard Caygill (Walter Benjamin: The Colour of Experience) Oo que move a obra de Walter Benjamin é a esperança de ver em qualquer dado da realidade concreta, material, a presença do infinito.
Ainda sobre crianças e cores, Arthur Nestrovski publicou, pela Cosacnaify, com ilustrações de Marcelo Cipis, um pequeno e imensamente poético livro infantil sobre a experiência de ver cores: mesmo as que não existem. Há em Cores das cores ilustrações sobre "a cor da cozinha de manhã", "a cor da noite na varanda", e sobre os diferentes verdes do jardim: ao sol, na chuva, na sombra. Uma página não tem cor nenhuma: fala-se da cor que o irmão mais velho diz ter como preferida, e que na verdade o irmão caçula sabe que não é a preferida dele... Não deixa de ser, a seu modo, uma experiência do infinito: cada cor se desmaterializa quando confrontada com o tempo, com a imaginação, com o que -sabemos-- não existe. Do mesmo modo, um arco-íris se dissolve antes que consigamos encontrar o tesouro que se esconde em seu fim.
Antes de seus estudos sobre Baudelaire e sobre o Drama Barroco Alemão, o crítico e filósofo Walter Benjamin dedicou-se a algumas especulações sobre a essência das cores --tema clássico no pensamento romântico alemão, desde Goethe. Cito um trecho muito bonito de "A visão das cores de uma criança", texto escrito entre 1914 e 1915:
A cor é algo espiritual, algo cuja claridade é espiritual, pois quando as cores se misturam, elas produzem novas cores, não um borrão. O arco-íris tem a pureza da infância.
O que interessava Benjamin era a idéia de que, de uma realidade sensível, empírica, material, como a cor, pudesse deduzir-se algo de espritual e infinito. O peso, a espessura, a grosseria da matéria tenderiam a fazer com que tentativas de superposição de muitas cores resultassem numa massa obscura e feia. É o que nos acontece quando, na infância, aprendemos que azul com amarelo dá verde; logo tentamos fazer isso com a tinta guache, e dá razoavelmente certo. Só que, depois de mais umas experiências e misturas, o resultado acaba sendo a famosa cor-de-burro quando foge. No computador, assim como na natureza, a mistura entretanto dá certo, novas cores sempre se criam, porque qualquer que seja a dosagem entre as três cores básicas, está sempre garantindo o resultado uma quantidade fixa de transparência e luz.
Segundo Martin Jay ("Is Experience Still in Crisis? Reflections on a Frankfurt School Lament", in The Cambridge Companion to Adorno), que cita os estudos de Howard Caygill (Walter Benjamin: The Colour of Experience) Oo que move a obra de Walter Benjamin é a esperança de ver em qualquer dado da realidade concreta, material, a presença do infinito.
Ainda sobre crianças e cores, Arthur Nestrovski publicou, pela Cosacnaify, com ilustrações de Marcelo Cipis, um pequeno e imensamente poético livro infantil sobre a experiência de ver cores: mesmo as que não existem. Há em Cores das cores ilustrações sobre "a cor da cozinha de manhã", "a cor da noite na varanda", e sobre os diferentes verdes do jardim: ao sol, na chuva, na sombra. Uma página não tem cor nenhuma: fala-se da cor que o irmão mais velho diz ter como preferida, e que na verdade o irmão caçula sabe que não é a preferida dele... Não deixa de ser, a seu modo, uma experiência do infinito: cada cor se desmaterializa quando confrontada com o tempo, com a imaginação, com o que -sabemos-- não existe. Do mesmo modo, um arco-íris se dissolve antes que consigamos encontrar o tesouro que se esconde em seu fim.
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